quinta-feira, 19 de março de 2009

PopArt

3Era uma mão estendia. Um contorno de unhas pintadas, de olhos pintados, de corpo pintado. Olhava diretamente para mim. Olhava? Será que realmente me via? Isto é, podia ver? Sorri meio sem graça. Ela estática, física, geométrica. O corpo milimetricamente desenhado, saído de uma história. De ação, de romance, de ficção talvez... Fictícia ela era? A mão ainda estendida.
Voltei à banca algumas vezes para comprar jornal, dissimular que queria encontrá-la novamente, que via a mão ainda estendida. Sempre. E foi num desses dias em que resolvi arriscar.
Olhei diretamente em seus olhos. Ela me olhou ainda mais fundo. Toquei a parede, o papel, sua mão fria. Apertei o papel e foi quando eu percebi. Ela apertou meus dedos de volta . Foi só um puxão e ela estava do meu lado. Ali, me encarando, parecia mais real do que nunca. Vendia-me algo? Comprava-me? Só custou um olhar, ela me ganhou.
Também para ela era uma novidade. Sentir outra pessoa, ouvir o caos da cidade que sempre esteve ao redor, o vento em seus cabelos, enquanto eu dirigia rápido pela rodovia. Tudo ganhava cor.
Rápido, rápido, mais rápido, até que tudo ao redor não passasse de borrões, que poderiam ter sido desenhados por uma criança de três anos. Ela era leve, tão leve que quase borrava também. Quase sai voando.
Levantei a capota do carro, mas ela pediu que não. Queria sentir o vento, que logo ficou mais forte e transformou-se em chuva. Gotas grandes e pesadas, caíam sobre sua face, apagando seus contornos.
Retornamos rapidamente à banca e antes que eu pudesse sentir o que é um beijo das histórias contadas nos livros, um beijo roubado, ganhado, comprado, que seja, um beijo qualquer, ela já estava de volta. Seu cabelo desarrumado por causa do vento. Seus olhos pintados estavam borrados. Era por conta da chuva? Eram suas lágrimas? Tinha lágrimas?
Me perguntava se nos veríamos novamente. Ela estava me observando do cartaz. Eu continuei andando, mas ela não me seguiu.